Quarta-feira, 9 de Janeiro de 2008
Viva a democracia! Viva a Europa! O Rei vai nú!

 

Fica-se hoje a saber, se alguém porventura (se é que é possível) ainda não sabia, que não haverá qualquer consulta popular (leia-se, referendo) à Constituição Federal Europeia.

Sim, isso, Constituição Federal Europeia, pois é isso mesmo que é. Bem pode o nosso excelentíssimo primeiro afirmar que não quebra promessa eleitoral alguma, que "tinha um compromisso com o Tratado Constitucional. Agora é o Tratado de Lisboa, que não existia na altura. Não tem nada a ver uma coisa com a outra".

Desculpas esfarrapadas, quando vemos a Chanceler Alemã Angela Merkel afirmar  "The substance of the Constitution is preserved. That is a fact", a 27 de Junho de 2007 no Parlamento Europeu, ou Giuliano Amato, ex-primeiro ministro italiano e segundo responsável pelo anterior texto, dizendo "The good thing about not calling it a Constitution is that no one can ask for a referendum on it" na London School of Economics a 20 de Fevereiro de 2007, ou ainda Giscard d'Estaing, ex-presidente francês e primeiro responsável pelo anterior texto, clamar "In terms of content, the proposals remain largely unchanged, they are simply presented in a different way (...) The reason is that the new text could not look too much like the constitutional treaty (...) cosmetic changes to the Constitution to make it easier to swallow", no Parlamento Europeu a 17 de Julho de 2007. De resto, o próprio Sócrates, "questionado em 25 de Julho de 2007, na SIC, sobre se um e outro texto não são, afinal, muito "parecidos", Sócrates disse que sim. "É a minha opinião", referiu."

A Constituição é a mesma, o federalismo é o mesmo, a militarização da Europa é a mesma. Só o nome se alterou, para um "bonito" Tratado de Lisboa.

Portugal, bem como os demais países pequenos, perdem. Reduz-se a representatividade no Parlamento Europeu, em detrimento do aumento por exemplo da Alemanhã. Acaba a rotatividade das presidências, acaba a obrigatoriedade de um membro de cada país na Comissão Europeia. O controlo dos mares passa para a União Europeia. É uma vez mais impulsionada a criação das forças armadas europeias. Por aí fora. Bem se vê, tudo propostas muito democráticas.

De resto, quanto a perda de soberania (a que ainda resta), estes dois dias foram já bastante ilucidativos. Há dois dias, foi o primeiro-ministro esloveno a dar recados a Portugal, afirmando "Penso que não seria sensato realizar um referendo" em Portugal, disse Janez Jansa, em declarações à agência Lusa, na capital da Eslovénia".

Mas como se não chegasse (claro está, chegava), não só o querido Cavaco mete também o bedelho, como assumidamente o faz enquanto moço de recados de Alemanhas, Inglaterras e outros que tais, nada interessadas em eventuais referendos para além do Irlandês, esse país de idiotas que ainda não alteraram a sua constituição nacional para deixarem de referendar questões europeias.

Claro está que ninguém está interessado em referendos. Aliás, é por decerto sintomático tanto receio de referendo. Em Portugal, a ter existido, eu cá até suspeito que teria sido aprovado, mas nalguns países mais ciosos da sua soberania, como anteriormente o fizeram a França e a Holanda, e agora se previa que o repetisse a Inglaterra, provavelmente seria reprovado.

Não pelas suas propostas miseráveis para a maioria dos países europeus, não! É porque as pessoas são estupidamente ignorantes, e não perceberiam a maravilha que é aquele texto. E como as massas ignaras não sabem ler politicamente, cabe a iluminados deputados tratarem do assunto: resta saber se o texto não é como é também por esse motivo.

Mas como tão bem nos lembra António Vitorino, não é só por causa dos ignorantes, é que referendar daria uma arma a quem é contra a construção europeia. Serão países? Imagino que não, a Constituição é tão boa que todos gostam dela. Deve ser, portanto, a Al-Qaeda.

Assim como assim, não é certamente pela quebra da promessa eleitoral que o povo se deve indignar. Já tinha mais era que estar habituado, já que o Governo só tem feito o que não disse que faria, e nada faz do que garantiu fazer. Compreende-se mal, portanto, a indignação do BE, que se limita a assinalar o não cumprimento da promessa eleitoral, ainda para mais indo apresentar uma moção de censura na Assembleia da República, que terá tanto de inútil como de inconsequente, mas sempre garante o necessário mediatismo, tão imprescindível ao mutante político português.

De resto, as posições da "esquerda de confiança" (olhe que não, olhe que não) quanto à União Europeia e sua constituição são conhecidas: nada contra, um bom projecto, mas enfim lá podia ser mais democrático, como dito sobejamente, se a Constituição Europeia viesse de uma assembleia constituinte seria aceitável. Nada contra a refeição, somente contra o arranjo floral.

Contrastam bem, sem dúvida, com as posições claras de quem, exigia o referendo, não por haver sido promessa de quem nunca as cumpriu, não por não gostar do método de redacção do texto, mas de quem sempre afirmou claramente ser de todo contra este modelo de Europa, neo-liberal, federalista, imperialista e, portanto, necessariamente militarista.

Só para terminar, e induzindo a analogia, se isto fosse na Venezuela, era uma ditadura horrorosa. Lá, ao menos, o povo é consultado e a derrota assumida democraticamente. Aqui, para não se correr o risco de ter de não assumir uma derrota, impõe-se e pronto.

 

Viva a democracia. Viva a Europa. O Rei vai nú.



Publicado por Alfredo às 11:53
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Terça-feira, 13 de Fevereiro de 2007
O Referendo e os Comunistas


Bom, que há a dizer sobre o resultado do referendo? O Sim ganhou não foi? Então que quer este gajo dizer ainda?

Apenas algumas coisinhas. Sobre as reacções aos resultados, registe-se o mau perder dos partidários do "Não", capazes de afirmar duas coisas extraordinárias: apelam à não alteração por o referendo não ter sido vinculativo, ao contrário do que disseram no passado, e têm a lata de afirmar que a maioria do povo não quer a mudança da lei, porque entendem que quem não votou quer tudo como está.

Boa interpretação da abstenção, à moda salazarista... Como lembrou a camarada Odete Santos, já na aprovação da Constituição fascista a abstenção contou como votos favoráveis. Vê-se bem, portanto, com quem os meninos do "Não" aprenderam as suas lições...

Além disso, duas coisas não podem deixar de ser ditas:

Primeiro, para os que já se recostam no sofá, a luta não terminou. Mas se considerarmos que mesmo entre os defensores do "Sim", a maioria não saiu do sofá senão para votar, é natural que se estejam já a aconchegar novamente. Mas a luta não terminou, porque o referendo foi apenas uma batalha (desnecessária) numa guerra, e outras batalhas se avizinham, porque há que garantir que a IVG será feita no Serviço Nacional de Saúde, há que garantir que não é travada pelos ditos objectores de consciência, e sobretudo há que garantir que não se dá um passo atrás, porque estejam certos que os hipócritas defensores do "Não", não se vão ficar por aqui...

Segundo, que esta vitória do povo e das mulheres portuguesas, em muito se deve a luta cerrada travada pelo Partido Comunista Português. Isto não pode deixar de ser dito. Quem esteve no terreno, nas ruas, nas feiras, nas fábricas, nas aldeias, como esteve o PCP? Quem esteve em campanha desde as primeiras horas da madrugada, às portas das empresas, quem esteve à chuva na rua a informar o povo, como esteve o PCP?

Ninguém. Estiveram recostados no sofá ou em debates inúteis, ou em iniciativas às 17 horas.

Nem movimentos, nem partidos, ninguém lutou nesta batalha como lutaram os comunistas. Foram os movimentos? Foi o PS, que se limitou a debates, a avultadas masturbações intelectuais? Não. Foi o PCP, que de manhã à noite esteve na rua, foram os seus militantes que, como sempre, abnegadamente deram o melhor de si para o progresso do nosso país.

E tal reflecte-se logo à partida numa análise fria dos resultados. Veja-se onde o "Sim" ganhou por maior margem, e concluir-se-á que foi nas regiões de maior influência comunista. Veja-se onde ganhou o "Não", e igualmente se verificará que foi onde as forças reaccionárias prevalecem.

Doa a quem doer, chamem-me oportunista, acusem-me de retirar proveitos partidários... Sei bem o que custou a tantos e tantos camaradas esta campanha, para as suas vidas, entregarem-se a esta luta como mais ninguém se entregou. Dá-me agora um certo nojo que alguns falem do empenho de PS, BE e movimentis afins, ou que por outro lado se enalteça a maturidade do povo português, e se silencie o trabalho dedicado de quem mais trabalhou por este resultado.

Mas se me dá nojo, também me passa ao lado. Porque não podia ser de outra maneira, ia-se lá agora falar no trabalho dos comunistas... Não o esperamos, e também não é por isso que lutamos; pouco nos interessa o reconhecimento e a autopromoção, interessa-nos sim lutar pelo que acreditamos.

Luto porque sonho, porque acredito, porque tenho ideais. Porque cada vez que de tal me esqueço, a vida vem-me lembrar que os meus sonhos e a minha luta são, em última análise, tudo o que importa. Porque são as unicas coisas que cá estão sempre, porque graças ao meu Partido não termino em mim mesmo.

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Publicado por Alfredo às 17:15
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Essencialmente, para o que me for apetecendo. Ideias sobre a sociedade, coisas da sociologia, análise de questões políticas... Comentários à actualidade, assuntos pessoais relativizados e quando me apetecer, também dá para chatear alguém.
Sociólogo, 28 anos, residente em Coimbra. Bolseiro de investigação na área do insucesso e abandono escolares no Ensino Superior. Mestrando em "Relações de Trabalho, Desigualdades Sociais e Sindicalismo".
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