Sexta-feira, 23 de Maio de 2008
Guantánamo, o PCP e a Comunicação Social

 

Está finalmente confirmado. Entre Julho de 2005 e Dezembro de 2007, nada mais nada menos que 56 voos da CIA, com prisioneiros ilegais, para a base de Guantanámo, passaram por Portugal.

 

Sim, leram bem, Dezembro de 2007, portanto já com diversas investigações em curso. Nada que, no entanto, envergonhe o actual e anterior Governo.

 

E quem dá, finalmente, a informação? O Governo português, em resposta a um requerimento apresentado pelo PCP, na Assembleia da República.

Como não nos conformamos com a mentira descarada, insistimos na exigência da verdade, e continuaremos, até que seja desvendada todo o colaboracionismo do PS, PSD e CDS-PP com as inomináveis violações dos mais elementares direitos humanos, por parte da agência de espionagem do imperialismo norte-americano.

 

O Governo afirma que nada sabia, nem podia, porque não controlou os voos. Portanto, aviões militares, ao serviço de um país suspeito de os utilizar na transferência ilegal de presos também ilegais, caso em investigação há já algum tempo, passam pelo espaço aéreo português, sem qualquer controlo.

Será normal? Como disse o deputado do PCP, Jorge Machado, "Se o Governo não os fiscalizou foi porque não quis (...) deviam ter sido feitas inspecções, até porque havia fortes indícios de que transportavam prisioneiros para Guantánamo (...) Portugal continua a ser conivente, por acção ou omissão, não obstante a denúncia pública e o escândalo".

 

Visto Guantánamo e o Governo, qual o porquê da comunicação social no título? Pela omissão, uma vez mais, do trabalho político do PCP.

 

As primeiras notícias surgidas dão conta do papel do PCP, no desvendar das informações agora reveladas. No entanto, se se derem ao trabalho de ver as notícias mais recentes, já quase não é referido, sendo gradualmente substituído pelo Bloco de Esquerda e pela euro-deputada socialista Ana Gomes.

 

Pior, sobre esta matéria, no noticiário das 13h, a SIC entrevista Fernando Rosas, deputado do BE, e um deputado do PS. No das 20h, entrevista somente Ana Gomes. Sobre o PCP, cujo requerimento permitiu obter estas informações, nada de nada.

 

Faz-me lembrar uma conversa há algum tempo, com uma pessoa que argumentava que o facto do trabalho do PCP não ser noticiado, e o do BE o ser de modo inversamente proporcional, se deveria à falta de contactos deste junto de jornalistas, ou falta de bons comunicadores...

 

Pois claro. O PCP apresenta um requerimento, em função do qual são reveladas um conjunto de informações. Face a isto, a televisão entrevista um deputado bloquista e dois socialistas.

 

Falta de contactos e comunicadores, ou uma comunicação social prestimosamente dedicada ao seu papel de classe? E não me venham falar que apareceu nos jornais e "só" não apareceu na televisão, porque a abrangência de públicos de cada meio é absolutamente incomparável; e, de qualquer modo, como referi, também da imprensa já está em vias de extinção.

 

Portanto, nada mais nada menos, que novo exemplo do papel de classe da comunicação social, face ao qual não pode deixar de omitir o PCP e enaltecer as supostas alternativas de esquerda... Aquelas que, como já referido, nada podem alterar.

 

PS: A quem se interessar pela temática da comunicação social, e o seu papel de classe na sociedade capitalista, sugiro a obra "Jornalismo e Sociedade", de Fernando Correia, publicada pelas Edições Avante.

 

Foto: http://www.amnestyusa.org/magazine/i/guantanamo.jpg



Publicado por Alfredo às 22:10
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Sábado, 19 de Janeiro de 2008
Nova machadada na democracia, via Bloco Central
Esses democráticos partidos do bloco central, leia-se PS e PSD, decidiram conjuntamente nova Lei Eleitoral Autárquica, profundamente democrática, como é expectável de tudo o que é conjuntamente decidido por tal par maravilha.

Supostamente, dizem os iluminados, as alterações têm por objectivo acabar com a situação de Câmaras Municipais onde, fruto de uma maioria da oposição, o executivo não consegue fazer qualquer trabalho ou tomar qualquer decisão.

O argumento seria justo, não fosse o facto de fazer de qualquer oposição uma espécie de clube que só trabalha pela negativa, não deixando o poder eleito governar, só porque lhe apetece. Podendo tal obviamente ocorrer, não passa de usar casos isolados para fazer regra.
Reforça, além disso, a ideia absolutamente bacoca, ainda que infelizmente cada vez mais adquirida, que só com maiorias absolutas é possível desenvolver a acção política, como se a essência da acção política não fosse, ou devesse ser, a criação de consensos.

O que nunca é efectivamente dito, é que em somente 13% do total de 308 municípios em Portugal, tal situação pseudo-justificativa se verifica: nos restantes 87%, o executivo eleito tem maioria absoluta.

Desmascarado então o argumento base, observe-se algumas das anti-democrátivas alterações implementadas com esta lei.

Primeiro e fundamental ponto, as Câmaras Municipais deixam de, como até agora, ser eleitas por listas, sendo contituídas à proporção das votações dos vários partidos. Supostamente, mas como já visto, falsamente, era essa situação de possível minoria do partido mais eleito que criaria a dita instabilidade.

A partir de agora, são candidatados somente os presidentes e não listas. O partido mais votado passa a constituir o executivo municipal a seu bel-prazer, obrigatoriamente detendo a maioria absoluta, sendo que os vereadores da oposição não poderão ultrapassar um terço da vereação. Mas tal nem sequer é obrigatório, o partido mais votado pode simplesmente fazer tábua rasa da vontade expressa pelo eleitorado e constituir a Câmara unicamente com vereadores do seu partido. Ou, por exemplo, para dar um ar de graça de democracia, ir buscar para a "oposição" (entre aspas, por motivos obvios) um par de vereadores do partido menos votado, ainda que outros tenham tido maior votação, já que a escolha é a seu bel-prazer.

O ataque anti-democrático é notório, e em duas frentes.

Por um lado, anula-se a vontade do povo, expressa pelo seu voto. Supondo que este, por sua vontade votando, atribui 40% ao PS, 30% ao PSD, 20% ao PCP e 10% ao Bloco.

O PS teria, neste exemplo, e anteriormente a esta lei, uma minoria relativa, sendo a vereação distribuída proporcionalmente, assim respeitando a vontade do povo. Teria, portanto de acordar com os restantes, ou apenas um, a actividade camarária.

Essa seria a vontade do povo, que não estaria interessado em dar maioria absoluta a um partido. Mas o povo é estupido, e não sabe votar.

Portanto, altera-se administrativamente essa maioria relativa de 40%, para uma maioria absoluta de 66%, sendo que os restantes 33% poderiam ser, por exemplo, do Bloco, o menos votado.

Parece-me obvio, a partir deste exemplo, o carácter duplamente anti-democrático da lei. Pura e simplesmente, a vontade do povo eleitor é administrativamente anulada, e os resultados transformados para gerar uma maioria absoluta que o eleitorado, manifestamente, não desejava.
Por outro lado, mas não menos anti-democrático, ainda que o eleitorado tenha expresso o interesse em ter vereadores de determinados partidos, tal é novamente anulado, deste modo afastando do exercício de cargos de poder os pequenos partidos, em favor do bloco central.

A segunda questão prende-se com as Assembleias Municipais. A alteração implementada para as Câmaras Municipais seria, supostamente, contrabalançada pelo reforço de poderes das Assembleias.

Supostamente, porque é uma farsa. A única alteração avançada prende-se com a possibilidade da Assembleia poder rejeitar a equipa proposta pelo omnipotente presidente. É muito bonito, o senão é que são precisos nada mais nada menos que três quintos dos deputados municipais para rejeitar a proposta, portanto virtualmente impossível, se olharmos as habituais composições das Assembleias. A mesma regra se aplica à possibilidade de demitir a Câmara.

Aliás, a farsa torna-se bem patente, se considerarmos que o centrão chumbou precisamente as propostas de reforço dos poderes das Assembleias apresentadas, nomeadamente, pelo PCP, designadamente em matéria do orçamento camarário.

Está, portanto, explicitada a golpada efectivada pelo PS e pelo PSD. Esmaga-se a vontade popular, anula-se os resultados eleitorais, cria-se presidentes quasi-divinos, assembleias inuteis, e maiorias absolutas administrativas. Muito bons, estes partidos símbolo da democracia...

Finalmente, há quem faça uma analogia, tão falsa como absurda, entre autarquia e governo, afirmando que à luz da lei anterior, a Câmara funcionava, numa analogia absolutamente idiota, como se o Governo tivesse ministros da oposição. Uma verborreia destas desmente-se facilmente: os ministros são escolhidos em função das pastas (ministérios) a que se destinam; os vereadores da oposição, fazendo parte da Câmara, não têm (tinham) automaticamente qualquer pasta (pelouro), apenas na medida em que o Presidente da Câmara o pretendesse: aliás, em boa parte das autarquias, os vereadores da oposição não têm qualquer pelouro, portanto o argumento não se justifica minimamente.

PS: A quem se interessar pelo tema, sugiro a leitura de uma série de textos da autoria de Vítor Dias, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui , aqui e aqui.


Publicado por Alfredo às 22:09
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Essencialmente, para o que me for apetecendo. Ideias sobre a sociedade, coisas da sociologia, análise de questões políticas... Comentários à actualidade, assuntos pessoais relativizados e quando me apetecer, também dá para chatear alguém.
Sociólogo, 28 anos, residente em Coimbra. Bolseiro de investigação na área do insucesso e abandono escolares no Ensino Superior. Mestrando em "Relações de Trabalho, Desigualdades Sociais e Sindicalismo".
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