Quarta-feira, 2 de Abril de 2008
Erva até pode ser, tabaco é que não!

Por vezes leio notícias que, tivesse eu alma, a deixariam absolutamente parva.

Há sociólogos que consideram a sociedade fundada no trabalho, ultrapassada. Beck, por exemplo, fala-nos na sociedade do risco, Giddens na modernidade tardia, Castel na sociedade da informação, há quem fale na sociedade do consumo, outros ainda na sociedade do lazer (esta é a melhor de todas, sobretudo para quem trabalha todos os dias, mas também não é nova, há muito existindo para a burguesia...).

Se eu fosse um sociólogo minimamente decente, exporia agora porque entendo que continuamos a viver numa sociedade alicerçada no trabalho. No entanto, como sou um sociólogo, na melhor das hipóteses, simplesmente medíocre, considerarei antes que vivemos na...na.........na..............

Sociedade-da-parvoeira-fanática-da-saúde-pública!

Já não bastava proibirem o tabaco em todo o lado, para bem da saúde de todos, porque o meu fumo não deve ser respirado por quem não o deseja. Apesar de eu ter de engolir o fumo dos automóveis dos outros, quando não conduzo, ou de ter o meu meio ambiente poluído por fábricas, cujos produtos não consumo. De resto, a poluição gerada pela fome lucrativa da burguesia industrial, não nos deve preocupar. Face ao egoísmo criminoso dos estuporados dos fumadores, que todos certamente já viram enfiar cigarros (ao contrário) na boca de criancinhas, as alterações climáticas, a produção industrial, a destruição de ecossistemas, são um problema menor. O que é preciso é acabar com as desnaturadas chaminés humanas.

A bem da saúde pública, claro está.

Também não bastava regulamentar todo o produto alimentar e mais algum, por um lado descaracterizando a nossa (riquíssima) cultura gastronómica, por outro (aliás, o fundamental) arrasando a pequena produção, a velhota que fazia o rissolito da tasca da esquina, a feira popular da aldeia e o bailarico lá da terrinha. Porque nenhum destes detém os meios económicos para fazer face a todas as exigências, a sempre vigilante ASAE lá porá a produção alimentar na mão do grande capital.

A bem da saúde pública, claro está.

Também não bastava (pretender) legislar o gosto e a estética. Porque isso de andar a enfiar metal nas trombas, no pirilau ou na piriquita não cabe na cabeça de ninguém. Ou andar a enfiar tinta debaixo da pele! Obviamente que é preciso estar louco para achar isso bonito, estético, ou coisa que o valha. A unica coisa que é bonito enfiar no corpo, é o menino do menino na menina da menina, com preservativo reconhecido pela ASAE, a bem da saúde púb(l)ica. Portanto, a bem do bom gosto, que se proíbam então as tatuagens e os piercings (fico à espera das rastas). Toca a baixar as calcinhas e a mostrar a genitália ao senhor inspector.

A bem da saúde pública, claro está.

Como nada disto bastava, afinal o que é mesmo bom, portanto aceitável, porque não prejudica a saúde pública, alias de ninguém, ao contrário do pastel de bacalhau, e é de muito bom gosto, ao contrário do piercing, é fumar a bela da ervinha. Desde que sem tabaco. Com tabaco já não pode ser, a erva é perfeitamente aceitável, com tabaco é que não, que prejudica a saúde pública. Supõe-se a ASAE a abrir os charrinhos à malta fixe, oferecendo depois uma mortalha novinha em folha como compensação, caso fosse purinha, sem um só pedacinho de tabaco.

Antes a alienação que o catarro.

A bem da saúde pública, claro está.



Publicado por Alfredo às 16:37
Link do post | Comentar | Adicionar aos favoritos

Essencialmente, para o que me for apetecendo. Ideias sobre a sociedade, coisas da sociologia, análise de questões políticas... Comentários à actualidade, assuntos pessoais relativizados e quando me apetecer, também dá para chatear alguém.
Sociólogo, 28 anos, residente em Coimbra. Bolseiro de investigação na área do insucesso e abandono escolares no Ensino Superior. Mestrando em "Relações de Trabalho, Desigualdades Sociais e Sindicalismo".
Junho 2008
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3
4
5
6
7

8
9
11
12
13
14

15
16
17
18
19
20
21

22
23
24
26
27
28

29
30


Utopias recentes

Erva até pode ser, tabaco...

Utopias antigas

Junho 2008

Maio 2008

Abril 2008

Março 2008

Janeiro 2008

Dezembro 2007

Junho 2007

Maio 2007

Abril 2007

Março 2007

Fevereiro 2007

Janeiro 2007

Dezembro 2006

Novembro 2006

tags

todas as tags

Links
Em busca da Utopia
 
Subscrever feeds